"ROSAS SILVESTRES"
Só esta expressão já me faz aspirar o ar como se o mundo fosse uma rosa crua. Tenho uma grande amiga que me manda de quando em quando rosas silvestres.
E o perfume delas, meu Deus, dá-me ânimo para respirar e viver.
As rosas silvestres têm um mistério dos mais estranhos e delicados:
à medida que vão envelhecendo vão perfumando mais.
Quando estão à morte, já amarelando, o perfume fica forte e adocicado, e lembra
as perfumadas noites de lua de Recife. Quando finalmente morrem, quando estão mortas , mortas - aí então, como uma flor renascida no berço da terra,
é que o perfume que se exala delas me embriaga.
Estão mortas, feias, em vez de brancas ficam amarronadas.
Mas como jogá-las fora, se mortas, elas têm a alma viva?
Resolvi a situação das rosas silvestres mortas,
despetalando-as e espalhando as pétalas perfumadas na minha gaveta de roupa.
Da última vez minha amiga me mandou rosas silvestres,
quando estavam morrendo e ficando mais perfumadas ainda,
eu disse para meus filhos:
Era assim que eu queria morrer: perfumando de amor.
Morta de exalando a alma viva.
Esqueci de dizer que as rosas silvestres são de planta trepadeira e
nascem várias no mesmo galho. Rosas silvestres, eu vos amo.
Diariamente morro por vosso perfume.
(Lispector, Clarice, Aprendendo a viver)
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