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sábado, 15 de janeiro de 2011

"ROSAS SILVESTRES"

"ROSAS SILVESTRES"
Só esta expressão já me faz aspirar o ar como se o mundo
fosse uma rosa crua. Tenho uma grande amiga que me
manda de quando em quando rosas silvestres.
E o perfume delas, meu
Deus, dá-me ânimo para respirar e viver.

As rosas silvestres têm um mistério dos mais estranhos e delicados:
à medida que vão envelhecendo vão perfumando mais.

Quando estão à morte, já amarelando, o perfume fica forte e adocicado,
e lembra
as perfumadas noites de lua de Recife.
Quando finalmente morrem, quando estão mortas , mortas - aí então, como uma flor renascida no berço da terra,
é que o perfume que se
exala delas me embriaga.
Estão mortas, feias, em vez de brancas
ficam amarronadas.
Mas como jogá-las fora, se mortas, elas têm a alma viva?

Resolvi a situação das rosas silvestres mortas,
despetalando-as
e espalhando as
pétalas perfumadas na minha gaveta de roupa.
Da última vez minha amiga me mandou rosas silvestres,
quando estavam
morrendo e ficando mais perfumadas ainda,
eu disse para meus filhos:

Era assim que eu queria morrer: perfumando de amor.
Morta de exalando
a alma viva.
Esqueci de dizer que as rosas silvestres são de planta trepadeira e
nascem
várias no mesmo galho. Rosas silvestres, eu vos amo.

Diariamente morro por vosso perfume.
(Lispector, Clarice, Aprendendo a viver)

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